Pular para o conteúdo principal

Educação, pedra e caminho

Educação, pedra e caminho

Luiz Otavio Cavalcanti
Avanços na educação brasileira começaram há 15 anos com o Fundef. Foram continuados pelo ministro Haddad no governo Lula (Fundeb, Enem) incentivando frequência escolar e aplicando mecanismos de avaliação. Mas o governo continua errando na opção preferencial pelos adultos e não pelas crianças. Explico.
Investimos tanto em educação (4,4% do PIB) quanto Coreia do Sul e mais do que Japão (3,5%). No entanto, a desproporção está no menor gasto em educação básica do que no ensino superior. Gasto público por aluno no ensino básico em países desenvolvidos é de 20% da renda per capita. No Brasil, é de 13%. Gasto público por aluno no ensino superior, aqui, é de 90% da renda per capita. Na Coreia é de 9,3%.

No momento em que investimos mais em ensino superior do que em ensino básico praticamos duas injustiças com crianças e adolescentes pobres: uma, não conseguimos retirá-los da rua dando-lhes escola e eles correm risco de terminar na delinquência. E, duas, garantimos ensino gratuito a faixas da classe média que poderiam pagar suas mensalidades.

Estudo de Samuel Pessoa (FGV) mostra que 30% a 50% da desigualdade, no Brasil, são causadas pela menor escolaridade. Por sua vez, a Pnad (IBGE) mais recente registra que as principais razões de baixo aproveitamento estão também nos próprios alunos e não só nas escolas. Entre essas razões: pouco interesse do aluno, baixa concentração do estudante, precária organização familiar. Essa informação acentua a importância, por exemplo, da função social (não) exercida por emissoras de televisão. Cujos programas têm quase nada de instrutivo e/ou construtivo.

Confirmando esse quadro, a posição média de estudantes brasileiros de ensino médio no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, 2006) é acabrunhante. Entre 57 países, o conhecimento do aluno brasileiro (de 15 anos) fica em 54º lugar em matemática (coreanos do Sul em 4º). Em ciências, estudante brasileiro fica em 52º lugar (estonianos em 5º). E em leitura, estudante brasileiro fica em 49º lugar (poloneses em 9º).

Seminário promovido pela Fundação Lemann trouxe a São Paulo o professor Martin Carnoy (Stanford). Em seu estudo, ele compara os sistemas educacionais brasileiro, cubano e chileno. Enxerga as seguintes vantagens no modelo cubano: opção preferencial pelo ensino básico (pelas crianças), forte supervisão sobre desempenho de professores em sala de aula, cursos de aperfeiçoamento de docentes, permanência de seis horas dos alunos em classe.

Outro seminário, da Fundação Itaú Social, revelou dados relevantes sobre a reforma do ensino básico em Nova Iorque. Um dos elementos estratégicos dessa experiência foi a redução de elos burocráticos entre administração superior do setor e gestores das escolas. Além dessa proximidade, estabeleceu-se sistema de cobrança e recompensa de professores em função do desempenho escolar. A propósito, em Pernambuco, a distância administrativa entre secretário de Educação e professores da rede escolar ocupa quatro níveis gerenciais.

Publicado no Jornal do Commércio em 17/09/09
Luiz Otavio Cavalcanti é diretor da Faculdade Santa Maria

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Beleza Total, Carlos Drummond de Andrade.

A beleza de Gertrudes fascinava todo mundo e a própria Gertrudes. Os espelhos pasmavam diante de seu rosto, recusando-se a refletir as pessoas da casa e muito menos as visitas. Não ousavam abranger o corpo inteiro de Gertrudes. Era impossível, de tão belo, e o espelho do banheiro, que se atreveu a isto, partiu-se em mil estilhaços. A moça já não podia sair à rua, pois os veículos paravam à revelia dos condutores, e estes, por sua vez, perdiam toda a capacidade de ação. Houve um engarrafamento monstro, que durou uma semana, embora Gertrudes houvesse voltado logo para casa. O Senado aprovou lei de emergência, proibindo Gertrudes de chegar à janela. A moça vivia confinada num salão em que só penetrava sua mãe, pois o mordomo se suicidara com uma foto de Gertrudes sobre o peito. Gertrudes não podia fazer nada. Nascera assim, este era o seu destino fatal: a extrema beleza. E era feliz, sabendo-se incomparável. Por falta de ar puro, acabou sem condições de vida, e um di

Mãe É Quem Fica, Bruna Estrela

           Mãe é quem fica. Depois que todos vão. Depois que a luz apaga. Depois que todos dormem. Mãe fica.      Às vezes não fica em presença física. Mas mãe sempre fica. Uma vez que você tenha um filho, nunca mais seu coração estará inteiramente onde você estiver. Uma parte sempre fica.      Fica neles. Se eles comeram. Se dormiram na hora certa. Se brincaram como deveriam. Se a professora da escola é gentil. Se o amiguinho parou de bater. Se o pai lembrou de dar o remédio.      Mãe fica. Fica entalada no escorregador do espaço kids, pra brincar com a cria. Fica espremida no canto da cama de madrugada pra se certificar que a tosse melhorou. Fica com o resto da comida do filho, pra não perder mais tempo cozinhando.      É quando a gente fica que nasce a mãe. Na presença inteira. No olhar atento. Nos braços que embalam. No colo que acolhe.      Mãe é quem fica. Quando o chão some sob os pés. Quando todo mundo vai embora.      Quando as certezas se desfazem. Mãe

Os Dentes do Jacaré, Sérgio Capparelli. (poema infantil)

De manhã até a noite, jacaré escova os dentes, escova com muito zelo os do meio e os da frente. – E os dentes de trás, jacaré? De manhã escova os da frente e de tarde os dentes do meio, quando vai escovar os de trás, quase morre de receio. – E os dentes de trás, jacaré? Desejava visitar seu compadre crocodilo mas morria de preguiça: Que bocejos! Que cochilos! – Jacaré, e os dentes de trás? Foi a pergunta que ouviu num sonho que então sonhou, caiu da cama assustado e escovou, escovou, escovou. Sérgio Capparelli  CAPPARELLI, S. Boi da Cara Preta. LP&M, 1983. Leia também: Velho Poema Infantil , de Máximo de Moura Santos.