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Crônicas da MPB: De Frente Pro Crime - João Bosco



De Frente Pro Crime



João Bosco

Tá lá o corpo estendido no chão
Em vez de um rosto uma foto de um gol
Em vez de reza uma praga de alguém
E um silêncio servindo de amém
O bar mais perto depressa lotou
Malandro junto com trabalhador
Um homem subiu na mesa do bar
E fez discurso prá vereador
Veio camelô vender anel, cordão, perfume barato
E a baiana prá fazer pastel e um bom churrasco de gato
Quatro horas da manhã baixou o santo na porta-bandeira
E a moçada resolveu parar, e então...
Tá lá o corpo estendido no chão
Em vez de um rosto uma foto de um gol
Em vez de reza uma praga de alguém
E um silêncio servindo de amém
Sem pressa foi cada um pro seu lado
Pensando numa mulher ou num time
Olhei o corpo no chão e fechei
Minha janela de frente pro crime

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