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Mostrando postagens de maio, 2016

Lições, Mia Couto

Não aprendi a colher a flor sem esfacelar as pétalas. Falta-me o dedo menino de quem costura desfiladeiros. Criança, eu sabia suspender o tempo, soterrar abismos e nomear as estrelas. Cresci, perdi pontes, esqueci sortilégios. Careço da habilidade da onda, hei-de aprender a carícia da brisa. Trêmula, a haste me pede o adiar da noite. Em véspera da dádiva, a faca me recorda, no gume do beijo, a aresta do adeus. Não, não aprenderei nunca a decepar flores. Quem sabe, um dia, eu, em mim, colha um jardim? - Mia Couto, em "Idades cidades divindades".  Lisboa:  Editorial   Caminho, 2007. Imagem: Regina Porto

O Que Estou Lendo?

A Mesa da Ralé   Michel Ondaatje Aos onze anos, Michael não sabe o que o espera quando embarca no navio Oronsay com destino à Inglaterra, onde iria estudar e reencontrar a mãe. Ao lado de dois outros garotos que conhece a bordo, aprende a tirar proveito da dupla invisibilidade de que goza o trio, graças a sua condição de passageiros da classe turística e de crianças sem supervisão de adultos. Infiltram-se sem serem notados na primeira classe, em cabines particulares de outros passageiros; passeiam livremente pelos porões de carga.  O narrador é o próprio Michael, já adulto e entregue à rememoração de sua saída definitiva do Oriente. Ao longo desse processo, ele tem notícias de sua prima Emily, com quem havia perdido contato desde o desembarque do Oronsay , e com décadas de atraso reúne as peças que faltavam para compreender um evento misterioso ocorrido a bordo.  Como ele, Emily também ocupou um lugar nas “mesas da ralé”, distantes o quanto possível da mesa do

Aprendizagem, Flávio Carneiro

- Mãe, cabelo demora quanto tempo pra crescer?  - Hã?  - Se eu cortar meu cabelo hoje, quando é que ele vai crescer de novo?  - Cabelo está sempre crescendo, Beatriz. É que nem unha.  A comparação deixa a menina meio confusa. Ela não está preocupada com unhas.  - Todo dia, mãe?  - É, só que a gente não repara.  - Por quê?  - Porque as pessoas têm mais o que fazer, não acha?  A menina não sabe se essa é uma pergunta do tipo que precisa ser respondida ou é daquelas que a gente ouve e pronto. Prefere não responder.  - Você é muito ocupada, não é, mãe?  - Hã?  - Nada, não.  A mãe termina de passar a roupa e vai guardando tudo no armário.

Riscos Para Um Cartão de Rendeira, Joaquim Cardozo

Os bilros cantam, tecendo Tecendo de renda branca, Com meandros e meneios De folha de mamoeiro; Rastejos na areia solta, Volteios de espuma branca. Os bilros danam, tendo Requebros de saia branca; Pêndulos de sombra fina Nas palmas de um dendezeiro: Para o lá e para o aqui Que leva e traz vela branca. Os bilros cruzam, tecendo Um voo de garça branca... Tão leve! Um sonho? deixado Na fronha de um travesseiro; Um sonho. Linhas de sonho Fiadas de uma nuvem branca. Os bilros contam, tecendo, Segredos de moça branca Que em sal se chorou no mar De tanto amar marinheiro; Tanto sal, tanto chorou Que se fez salina branca. Os bilros param. Tecendo Durezas de pedra branca.   Gravando em letras vazadas O mesmo adeus derradeiro; - Vazio amanhã: sem dia - Futuro: saudade branca. Imagem do google

20 Melhores Livros Infantis e Juvenis de 2016

Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil divulgou os vencedores do Prêmio FNLIJ 2016 Inês -  Roger Melo e Mariana Massarani( 5-8 anos) Lá e Aqui, Carolina  Moreyra e Odilon Moraes  Iluninuras , Rosana Rios (juvenil) Haicais Visuais ,  Nelson Cruz (a partir de 9 anos) Jornada , Aaron Becker (infantil) Malala, a menina que queria ir para a escola,    Adriana Carranca (infantil) Caderno Veloz de Anotações Poemas e Desenhos ,  Ricardo Azevedo (juvenil) Eu Sou do Tipo Que Costura Versos Com a Linha do Equador ,Múcio Goes Era Uma Vez ...,  Benjamin Lacombe O Bobo do Rei , Angelo Brandini Teatro Infantil, história, leitura e propostas .  org. Fabiano Grazioli Histórias Russas, Ana Maria Machado A Flauta Mágica e o livro da sabedoria ,  Del Candeias A Vida No Céu ,  José Eduardo Agualusa (juvenil) Meia Hora Para Mudar Minha Vida ,  Alice Vieira (juvenil) Contos da Mamãe Gansa,   Charles Perra

Vamos Pensar?

Albert Einstein falou e Carlos Ruas desenhou.  Vamos pensar? Tudo aquilo que o homem ignora, não existe para ele. Por isso o universo de cada um se resume ao tamanho do seu saber. Albert Einstein. Fonte: www.umsabadoqualquer.com Charge: Carlos Ruas.

Convite Aos Poetas da Vida, da Natureza, da Beleza...

Fotógrafos, Pintores e Artistas Plásticos, esse convite é pra vocês: ANE - Associação Águas do Nordeste  Estamos abrindo nosso quintal para artistas. Neste sábado, 21, vamos receber criativos de diferentes áreas (pintura, ilustração, fotografia...) para conversamos sobre natureza, arte e água. Queremos disponibilizar nosso espaço para alimentar a criatividade do artista e criar uma oportunidade para um diálogo com a natureza. Nosso quintal é uma pequena reserva de Mata Atlântica. Essa lindeza aí abaixo. Quer participar do encontro? Fala com a gente ! Sabe de alguém que gostaria de participar? Compartilhe a mensagem. Mais detalhes: suzanavalenca@gmail.com

O Primeiro Beijo, Clarice Lispector

Os dois mais murmuravam que conversavam: havia pouco iniciara-se o namoro e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com o que vem junto: ciúme.  - Está bem, acredito que sou a sua primeira namorada, fico feliz com isso. Mas me diga a verdade, só a verdade: você nunca beijou uma mulher antes de me beijar? Ele foi simples:  - Sim, já beijei antes uma mulher.  - Quem era ela? - perguntou com dor.  Ele tentou contar toscamente, não sabia como dizer.  O ônibus da excursão subia lentamente a serra. Ele, um dos garotos no meio da garotada em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe no rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso como os de uma mãe. Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir - era tão bom. A concentração no sentir era difícil no meio da balbúrdia dos companheiros.  E mesmo a sede começara: brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do motor, rir, gritar, pensar, sentir, puxa

Zelos,José de Alencar

Tenho ciúme Ciume,Edvard Munch   Do ar que gira E que respira O teu perfume. Tenho ciúme Da luz que bebe Nos olhos d'Hebe O brando lume. Tenho ciúme Desse retiro Que ouve o suspiro Do teu queixume. Tenho ciúme Da flor, senhora, Que em ti adora Celeste nume. Tenho ciúme De quanto existe Que me fez triste E me consome. Cidade do Rio, 25 de fevereiro de 1889. Fonte: www.antoniomiranda.com.br Imagem: Ciume  - 1934/35 Óleo sobre tela 78x117cm, Munch musset, Oslo 

Embriague-se! Charles Baudelaire

     É preciso estar sempre embriagado. Isso é tudo: é a única questão. Para não sentir o horrível fardo do Tempo que lhe quebra os ombros e o curva para o chão, é preciso embriagar-se sem perdão.      Mas de que? De vinho, de poesia ou de virtude, como quiser. Mas embriague-se.     E se às vezes, nos degraus de um palácio, na grama verde de um fosso, na solidão triste do seu quarto, você acorda, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, pergunte ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunte que horas são e o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio lhe responderão: “É hora de embriagar-se! Para não ser o escravo mártir do Tempo, embriague-se; embriague-se sem parar! De vinho, de poesia ou de virtude, como quiser”. Tradução: Jorge Pontual Fonte:www.notaterapia.com.b r

Dia Das Mães 2016

Vixe,  O cabra pode escolher muita coisa nessa vida... Ser artilheiro ou goleiro, pedalar ou correr, Inté o sabor das coisas a gente pode escolher! Mas a coisa mais joiada, mais preciosa, mais arretada da vida da gente, Simplesmente não se escolhe... A MÃE! Ela que é um pedacim de Deus no mêi do mundo, Um tantim assim de bravura, e um tantão assim de ternura. Mãe é doce feito mel de rapadura, macia feito algodão, cheirosa feito milho na fogueira numa noite de São João. Mãe é pura perfeição, não tem pra que escolher. E mesmo assim, se eu tivesse a graça desse poder, de todas as mães do mundo, teria escolhido você!

Bruxas Não Existem, Moacyr Scliar

Quando eu era garoto, acreditava em bruxas, mulheres malvadas que passavam o tempo todo maquinando coisas perversas. Os meus amigos também acreditavam nisso. A prova para nós era uma mulher muito velha, uma solteirona que morava numa casinha caindo aos pedaços no fim de nossa rua. Seu nome era Ana Custódio, mas nós só a chamávamos de "bruxa".  Era muito feia, ela; gorda, enorme, os cabelos pareciam palha, o nariz era comprido, ela tinha uma enorme verruga no queixo. E estava sempre falando sozinha. Nunca tínhamos entrado na casa, mas tínhamos a certeza de que, se fizéssemos isso, nós a encontraríamos preparando venenos num grande caldeirão.  Nossa diversão predileta era incomodá-la. Volta e meia invadíamos o pequeno pátio para dali roubar frutas e quando, por acaso, a velha saía à rua para fazer compras no pequeno armazém ali perto, corríamos atrás dela gritando "bruxa, bruxa!".  Um dia encontramos, no meio da rua, um bode morto. A quem pertencera

A Solidão e o Seu Desgaste, Carlos Pena Filho

Frequentador da solidão, às vezes Jogava ao ar um desespero ou outro, Mas guardava os menores objetos Onde a vida morava e o amor nascia. Era uma carga enorme e sem sentido, Um silêncio magoado e impermeável... A solidão povoada de instrumentos, Roubando espaço à andeja liberdade. Mas, hoje, é outro que nem lembra aquele Passeia pelos campos e o s despreza E porque sabe com certeza clara, O princípio e o fim da coisa amada, Guarda pouco da vida e o que retém É só pelo impossível de eximir-se.