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Mostrando postagens de outubro, 2017

Dia D - Sentimental, Carlos Drummond de Andrade

Ponho-me a escrever teu nome com letras de macarrão. No prato, a sopa esfria, cheia de escamas e debruçados na mesa todos contemplam esse romântico trabalho. Desgraçadamente falta uma letra, uma letra somente para acabar teu nome! - Está sonhando? Olhe que a sopa esfria! Eu estava sonhando... E há em todas as consciências este cartaz amarelo: "Neste país é proibido sonhar" In: ANDRADE, Carlos Drummond de. Seleta em prosa e verso,Rio de Janeiro:Ed.Record1985,p.165-166 Imagem: Caricaturista Gilmar. Veja mais Carlos Drummond de  Andrade  em:    Agradável Supresa Drummond em Defesa de Nara Leão Porque hoje é...  

O Mendigo do Viaduto do Chá, Regina Ruth Rincon Caires

     A moeda corrente era o cruzeiro. A passagem de ônibus custava sessenta centavos. O ano era 1974.       Eu trabalhava no centro da cidade, em um banco que ficava na Rua Boa Vista. Morava longe, quase ao final da Avenida Interlagos, e usava diariamente o transporte coletivo. Meu trabalho, no departamento de estatística, resumia-se a somar os números datilografados em planilhas e mais planilhas fornecidas pelas agências do banco. Somas que deveriam ser checadas, e que eram efetuadas nas antigas calculadoras elétricas com suas infernais bobinas, conferidas e grampeadas nas respectivas planilhas. Não fosse o café para espantar o sono durante as diárias e rotineiras oito horas de trabalho, nenhuma soma teria sido confirmada.

Guriatã Um Cordel Para Menino, Marcus Accioly

XXI do trem-de-ferro Quem grita na noite? Não vejo ninguém, é o eco do grito do apito do trem, é a boca-da-noite que grita também, é o eco do eco que ecoa no além. Quem grita na noite? Não vejo ninguém, é o grito da ponte debaixo do trem, é o vento que chora por morte de alguém, é o coro das almas que dizem amém. Quem grita na noite? Não vejo ninguém, é a boca-do-túnel na frente do trem, é o grito sem grito de um eco que vem dos montes que aos montes ecoam mais cem. Quem  grita na noite? Não vejo ninguém, é o sonho-barulho das rodas do trem, é a luz de uma estrela que tange belém no sino-silêncio que a noite não tem. Quem grita na noite? Não grita ninguém, é o trem dos fantasmas nos trilhos sem trem, é a voz dos dormentes que às vezes contém o grito da vida que a morte detém. .